ERA DO GELO - ÚLTIMO MÁXIMO GLACIAL

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A GLACIAÇÃO WÜRM: O ÚLTIMO MÁXIMO GLACIAL

Terra, Pleistoceno do período Quaternário da era Cenozoica. Cerca de 20 mil anos atrás, a temperatura média do planeta girava em torno de 7 a 8°C. Esse cenário ficaria conhecido pela Ciência como Era do Gelo, Último Máximo Glacial ou Glaciação Würm. Mas, como pode ser visto em 

, a história geológica terrestre tem sido marcada por longos períodos de frio intenso desde a Glaciação Huroniana. 

Você consegue imaginar, por exemplo, que o nosso planeta já passou por cinco períodos congelantes em menos de 3 milhões de anos?! Só no Pleistoceno (época que abarca o período entre 2,588 milhões e 11,7 mil anos atrás) ocorreram diversos desses fenômenos, caracterizados pelas quedas súbitas da temperatura da Terra. Foram eles: Glaciação Donau (há cerca de 2 milhões de anos), Glaciação Günz (há cerca de 700 mil anos), Glaciação Mindel (há cerca de 500 mil anos), Glaciação Riss (há cerca de 300 mil anos) e Glaciação Würm (há cerca de 150 mil anos).

Em temperaturas tão baixas as paisagens também passaram por mudanças, com o congelamento de lagos e a redução do nível do mar. Os continentes eram cobertos por espessas camadas de gelo e a vida só era possível para quem resistia às baixas temperaturas. Dentre os animais que compunham a megafauna adaptada ao frio extremo estavam alguns mamíferos. Atualmente, o Museu de História Natural do Sul do Estado do Espírito Santo (Muses) apresenta em seu acervo histórico-científico peças dos esqueletos de dois deles, que se destacaram nesse período: a preguiça-gigante e a anta.  

OS MAMÍFEROS DO ÚLTIMO MÁXIMO GLACIAL NO MUSES: A ANTA-BRASILEIRA

Sabia que o Muses possui em seu acervo partes do esqueleto do maior mamífero vivente no Brasil? E se disséssemos a você que os ancestrais desse animal também viveram durante o Último Máximo Glacial?

A anta (ou anta-brasileira), cujo nome científico é Tapirus terrestris, é considerada o maior mamífero terrestre do Brasil e o segundo maior da América do Sul. Esse animal pode chegar a pesar 300kg e medir até 242cm de comprimento. Típicas da região que se estende do Sul da Venezuela até o Norte da Argentina, podem ser encontradas em áreas abertas e florestas, em regiões próximas a corpos d’água (como rios e afluentes). No Brasil, essas espécies estão distribuídas na Amazônia, nas faixas de Mata Atlântica, no Cerrado e no Pantanal. 

Os registros ósseos de antas presentes no Muses chegaram à instituição por meio de doações. Dentre elas, estão vários crânios e ossos que advêm de animais que foram atropelados na BR-101, no trecho que corta a Reserva Biológica de Sooretama, localizada no Norte do estado do Espírito Santo. Inicialmente as antas atropeladas haviam sido coletadas por pesquisadores da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), para a realização de estudos no Campus Universitário de Alegre (ES).

O maior mamífero terrestre: a anta. Fonte da imagem: Wikipedia/Bernard DUPONT 

Mas agora que sabemos dessas informações, você tem ideia do quanto esses mamíferos contribuem para o meio ambiente? 

A anta é um animal frugívoro, ou seja, que se alimenta de frutos, plantas e folhas. É essa característica que a torna fundamental para o equilíbrio dos ambientes onde se insere, já que é importante dispersora de sementes. Assim como os jacus (que podem ser vistos no evento 

), as antas engolem as sementes e as liberam pelas fezes em ambientes aquáticos, sendo espalhadas pela correnteza em seus habitats naturais - por esse motivo é que são chamadas de "jardineiras da natureza". Esse comportamento é um dos responsáveis, por exemplo, pela manutenção das florestas de palmeiras na América do Sul, principalmente os buritizais na Amazônia e no Cerrado brasileiros. 

As antas têm grande importância na manutenção dos buritizais. Fonte da imagem: Associação Mineira de Defesa do Ambiente 

Na Venezuela, as antas costumam se alimentar de plantas em clareiras ou em floresta secundária, evitando espécies com espinhos, comuns em localidades com vegetação mais densa. No Peruyou, elas optam pelos frutos de buriti, fruto de palmeira que é o favorito da espécie no geral. No Brasil, seus hábitos alimentares variam de acordo com a região: na parte da Amazônia, frutos e sementes de plantas das famílias Fabaceae, Araceae e Anacardiaceae são a base da dieta; no Cerrado e nas zonas de transição para a Mata Atlântica, as antas normalmente se alimentam de folhas e brotos; em áreas alagadas, como o Pantanal, elas comem plantas aquáticas. Contudo, a redução desses biomas pela ação humana tem ameaçado as antas, fazendo com que a espécie seja cada vez mais rara nos locais que registram sua presença. 

De acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais (IUCN), a anta-brasileira já consta como "Vulnerável" na lista de animais ameaçados de extinção. Como também apresentado em

, o aumento no número de queimadas nas regiões da Amazônia, do Pantanal e do Cerrado (que, até outubro de 2020, já era superior ao número de anos anteriores) tem sido um dos fatores agravantes para os status de conservação de determinadas espécies de vegetais e animais. No caso das antas isso toma contornos mais dramáticos, já que dentre suas características está o seu comportamento solitário.

Quando avistadas em pares, provavelmente há uma fêmea em período de reprodução ou em unidades familiares, com filhotes. Além desses fatores complicadores, temos também o fato de que esses animais têm um processo de reprodução lento, com gestações que podem durar mais de 400 dias e que resultam no nascimento de apenas um filhote por ninhada. 

No Espírito Santo, as antas estão distribuídas na região Norte. As principais ameaças a esses animais têm sido o desmatamento, a fragmentação das florestas e a caça predatória ilegal, assim como também acontece com os jacarés-do-papo-amarelo, que podem ser conhecidos no evento

Além disso, é frequente o atropelamento desses mamíferos em rodovias, já que muitas delas estão localizadas em reservas de proteção ambiental onde tais animais vivem. Porém, nos últimos anos estudos empreendidos por pesquisadores capixabas têm desenvolvido técnicas de mapeamento de pegadas, que contribuem para a conservação da espécie, como o Programa Pró-Tapir.

Site do projeto Pró-Tapir: www.protapir.org 

Iniciado em 2011, o Programa Pró-Tapir realiza o monitoramento e a preservação das antas na Mata Atlântica do Espírito Santo, tendo em 2019 abrangido suas ações para a proteção dos ungulados (grupo de mamíferos do qual as antas fazem parte) distribuídos nessa região. A partir dessa mudança, as queixadas, os catetos e os veados passaram a compor, juntamente às antas, a lista de animais monitorados e preservados pelo projeto.

Agora você deve estar se perguntando: mas como um animal que vive em regiões de altas temperaturas pode ter vivido numa Era Glacial? Bem, nós explicamos: o gênero Tapirus (do qual as antas fazem parte) conta atualmente com diferentes espécies tais como a Tapirus terrestris e a Tapirus kabomani, que ocorrem em território brasileiro, por exemplo. Porém, a espécie que viveu na Glaciação Würm já foi extinta. Denominada de Tapirus californicus, esta anta viveu no final do Pleistoceno, desaparecendo por volta de 13 a 11 mil anos atrás. Os achados fósseis da T. californicus indicam que esse mamífero habitou principalmente as regiões costeiras do Sul da Califórnia, estado litorâneo do oeste dos Estados Unidos.

Estima-se que seu peso máximo era de 225kg, chegando a medir até 140cm. Além disso, essa anta pré-histórica também possuía comportamentos solitários e era um animal herbívoro, apresentando uma dieta rica em arbustos, folhas, plantas aquáticas, frutos e sementes. Pela época em que viveram, supõe-se que seus predadores eram o leão-americano, os paleoamericanos, o smilodon e o lobo pré-histórico - os mesmos caçadores de outra espécie herbívora contemporânea a elas: a preguiça-gigante.

O MAMÍFEROS DO ÚLTIMO MÁXIMO GLACIAL NO MUSES:

A PREGUIÇA-GIGANTE

A megafauna do Pleistoceno era caracterizada pela grande dimensão dos animais que a compunham, tais como os tatus-gigantes, mamutes, tigres-dente-de-sabre, cavalos e ursos pré-históricos, toxodontes e preguiças-gigantes. Como pode ser notado em 

, a emersão do istmo do Panamá há 3 milhões de anos viabilizou a migração dessa megafauna entre as Américas, impactando diretamente na ascensão e extinção de alguns desses animais. Os registros fósseis de um deles hoje fazem parte do acervo do Muses: estamos falando da preguiça-gigante.

Imagine um animal enorme, com cerca de 4m de altura. Pois era essa a proporção da preguiça-gigante, mamífero pré-histórico já extinto que viveu há cerca de 10 mil anos. Proveniente da região atualmente conhecida como Patagônia, na América do Sul, a espécie posteriormente migrou para regiões mais ao norte. 

Assim como você pode conferir no evento 

, os coprólitos (fezes fossilizadas) são registros fundamentais para compreendermos os hábitos alimentares de diversas espécies animais do passado e no caso das preguiças-gigantes isso não seria diferente: esses mamíferos tinham uma alimentação baseada basicamente na ingestão de arbustos rasteiros até folhagens presentes em altas árvores. Herbívoras, as preguiças-gigantes tinham uma série de adaptações físicas que visavam facilitar o acesso a esses alimentos: lábio superior e a língua em formatos específicos que serviam para agarrar a vegetação, presença de garras essenciais para apanhar as folhas e dentes adaptados para vegetais duros e fibrosos. Tais adaptações só foram conhecidas por meio do estudo de fósseis. 

Em 1834, o naturalista e paleontólogo dinamarquês Peter Wilhelm Lund (1801-1880) encontrou na Região Metropolitana de Belo Horizonte (MG), um fóssil da preguiça-gigante, datado de cerca de 9 mil anos. Essa descoberta indicou que esses animais pré-históricos já habitavam o território brasileiro há milênios. Alguns achados fósseis e estudos recentes também indicam a presença das preguiças-gigantes no Espírito Santo. O Laboratório de Paleontologia vinculado ao Campus de Goiabeiras da Ufes possui hoje uma peça fóssil encontrada na localidade de Cachoeiro de Itapemirim, município do Sul capixaba. Utilizada em pesquisas acadêmicas, existem planos para que o objeto seja exposto futuramente no Muses. Além desse exemplar, alguns registros fósseis encontrados no distrito de Gironda (localizada em Cachoeiro) estão no Museu de Ciências da Terra, no Rio de Janeiro. Outras partes de fósseis pertencem a uma família da região, cuja propriedade foi o local onde foram feitas as escavações. 

Outros achados recentes revelaram que essa espécie habitou diversas regiões brasileiras, abrangendo até mesmo países da América do Sul. O pesquisador brasileiro Cástor Cartelle é reconhecido internacionalmente como uma das maiores referências no campo da Paleontologia. Em abril de 2019, Cartelle, até então professor e diretor do Museu de Ciências Naturais da PUC de Minas Gerais, e sua equipe recolheram cerca de 200 peças fossilizadas de uma nova espécie de preguiça-gigante. Nomeado de Glossotherium phoenicis, o animal teria habitado os estados de São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso, Bahia, Pernambuco e Paraíba, distribuindo-se até a Venezuela. 

O grupo das preguiças-gigantes foi constituído por seis famílias e 88 gêneros, todos extintos. Vimos que algumas teorias apontam os movimentos migratórios como responsáveis pela extinção da megafauna em toda a extensão do continente americano, mas ainda não se sabe ao certo o que levou ao desaparecimento das preguiças-gigantes. Alguns pesquisadores apontam as caças realizadas pela espécie humana como um outro fator crucial para o fim da espécie. No entanto, essa hipótese não é um consenso e os que discordam creem que as mudanças climáticas durante o Pleistoceno desempenharam um impacto maior.

A HIPÓTESE DA ORIGEM ÚNICA E AS MIGRAÇÕES DA ESPÉCIE HUMANA ENTRE OS CONTINENTES

Ao longo de todas as glaciações só há evidências de ancestrais humanos na última Era do Gelo (Glaciação Würm), ocorrida há cerca de 20 mil anos. Os chamados Cro-Magnons tiveram seus restos fósseis detectados em 1868, pelo geólogo e paleontologista francês Louis Lartet (1840-1899), na Caverna de Cro-Magnon, localizada no sudoeste da França. 

Apresentando corpos robustos e musculatura forte, os Cro-Magnons foram considerados bastante altos se comparados a outros ancestrais humanos (como os Neandertais), podendo medir de 1,66 a 1,71m. Tinham testa reta e um rosto curto e largo, sendo os primeiros humanos a apresentarem queixo arredondado e destacado. Além disso, seu cérebro era um pouco maior do que o do Homo sapiens sapiens, que é correspondente ao “humano contemporâneo”. Os Cro-Magnons costuravam suas roupas feitas de peles de animais com agulhas de osso, cozinhavam alguns alimentos e construíam moradias na ausência de abrigos naturais. A sobrevivência dessa espécie se deu principalmente pelo seu comportamento nômade durante o Último Máximo Glacial. Eles estavam sempre mudando, na tentativa de se protegerem das transformações físicas e climáticas que ocorriam nesse período. 

Os achados na Caverna de Cro-Magnon têm cerca de 15 a 35 mil anos de idade e são, até agora, os registros mais antigos do Homo sapiens na Europa. Entretanto, essa descoberta não representa o ponto inicial da história da espécie humana. Expedições científicas e escavações realizadas nas últimas décadas no Grande Vale do Rifte (que pode ser conhecido no evento 

) têm fornecido evidências de que os mais recentes ancestrais humanos viveram e se diversificaram na região que hoje compreende os países africanos do Quênia, da Tanzânia e da Etiópia. Em acréscimo, pesquisas como as da geneticista estadunidense e professora da Universidade da Pensilvânia, Sarah Tishkoff (1965-), acerca da evolução do genoma humano têm reforçado a Hipótese da Origem Única. Essa teoria é a mais aceita dentro da Paleoantropologia e defende a origem dos seres humanos atuais a partir de Homo sapiens que surgiram no Leste Africano há cerca de 300 mil anos e deixaram o continente há aproximadamente 200 mil anos, espalhando-se pelo mundo.

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Published in 20/07/2021

Updated in 27/09/2021

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