DIVERSIFICAÇÃO DOS MAMÍFEROS

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A LINHAGEM ADAPTATIVA DOS CÃES E A DIVERSIFICAÇÃO DOS MAMÍFEROS 

Japão, 1925. Hidesaburō Ueno (1871-1925), professor da Universidade de Tóquio, era um amante de cachorros e tinha levado seu cão da raça Akita, Hachiko (1923-1935), para morar em Shibuya, cidade onde residia. Diariamente, por um ano e meio, Hachiko o esperava na entrada da estação de Shibuya, sempre o acompanhando na volta do trabalho. Naquele mesmo ano, o professor Ueno teve um AVC (Acidente Vascular Cerebral) súbito durante uma reunião de professores e nunca mais retornou a Shibuya. No entanto, Hachiko permaneceu esperando o retorno de seu antigo dono por dez anos, na entrada da estação, até dar seu último suspiro e vir a falecer, em 1935.

Hachiko (1923-1935) em seus últimos anos de vida. Fonte da imagem: Wikipedia 

Hoje um símbolo nacional do Japão, a história de Hachiko foi retratada em diversos filmes, como Hachikō monogatari (1987), dirigido pelo japonês Seijirō Kōyama; e Sempre ao seu lado (2009), rodado pelo sueco Lasse Hallström e estrelado pelo ator estadunidense Richard Gere. Essa história também nos remete a características marcantes desses que, provavelmente, são os primeiros animais a serem domesticados pelos seres humanos: os cães. Lealdade, mutualidade, inteligência e habilidade em aprender pela imitação e integração às atividades sociais são algumas dessas qualidades. 

Mas você sabia que os cães descendem de ancestrais comuns, como os lobos-cinzentos, que viveram no Último Máximo Glacial (explore mais sobre  em 

)? E que no Egito Antigo esses animais eram reverenciados como deuses conhecedores do “outro mundo”? Ou que no Brasil a mestiçagem entre diversas espécies caninas resultou em diversas novas espécies, como os famosos vira-latas e os cachorros-do-mato? Dentre essas variações e adaptações, o cachorro-do-mato é uma espécie que ocorre em boa parte do  território brasileiro, despertando o interesse científico a ponto de se tornar peça de museu, nesse caso parte do acervo do Museu de História Natural do Sul do Estado do Espírito Santo (MUSES).

Os lobos e os cães possuem ancestrais em comum. Fonte da imagem: Pixabay 

O CACHORRO-DO-MATO DO MUSES E OS MAMÍFEROS EUTÉRIOS

A peça taxidermizada do cachorro-do-mato que compõe o acervo do MUSES é  da espécie Cerdocyon thous, também chamado graxaim-do-mato. Membro da família Canidae, essa espécie surgiu há aproximadamente 15 mil anos e está distribuída geograficamente por toda a América do Sul, com exceção da região amazônica, habitando geralmente áreas abertas, campos e cerrados e arredores de montanhas. Segundo a classificação da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), hoje esses animais não se encontram sob risco de extinção.

Cachorro-do-mato exposto no Muses. 

Animais de porte médio que podem medir de 60 a 70cm de comprimento (além de 30cm de cauda), as cores da pelagem do cachorro-do-mato podem variar entre cinza e castanho, com faixas de pelo pretas que vão da nuca até a ponta da cauda, além da região peitoral de cor clara. Predador nato, essa espécie alimenta-se de pequenos mamíferos e alguns outros vertebrados como serpentes, aves e anuros, possuindo dentição específica para dilacerar musculaturas. Entretanto, também apresenta dieta onívora, composta por frutas, plantas e insetos.

O cachorro-do-mato é um animal territorialista: cada macho demarca um território para si e, quando um animal tenta invadir o território do outro, há competição. Existem também relatos de competição por território com outras espécies de canídeos, como por exemplo a raposa-do-campo (Pseudalopex vetulus). 

Cachorro-do-mato 

Assim como na maioria dos mamíferos, essa espécie canina possui um ciclo reprodutivo bem padronizado, com períodos regulares de reprodução e outros limitados de receptividade sexual. Canídeos geralmente atingem a puberdade a partir dos sete meses, mas isso pode variar de espécie para espécie, de acordo com o porte. Com um tempo de gestação de aproximadamente dois meses, as fêmeas podem chegar a produzir duas ninhadas por ano (a cada 7 ou 8 meses), sendo que cada uma delas pode gerar de 3 a 6 filhotes. Essa característica inclui essa espécie dentro da categoria de mamíferos eutérios, mas o que isso significa?

Como pode ser visto no evento 

, os mamíferos eutérios (ou placentários) são animais que possuem ou realizam uma gestação placentária. Esse modo de reprodução, denominado vivíparo, se dá pela formação de um embrião a partir da união entre espermatozoide (produzido por machos) e óvulos (produzidos por fêmeas) dentro do organismo da fêmea. Após o período de gestação no útero (que é variante para cada espécie), o embrião ganha corpo até o nascimento de um filhote. Compondo o maior grupo dessa classe de animais, os mamíferos eutérios são representados pelos felídeos (gatos, tigres, onças, leões etc.), canídeos (cães, lobos etc.), ungulados (cavalos, antas, hipopótamos etc.), hominídeos (símios, primatas e seres humanos), entre outros.

Contudo, essa é apenas uma das mudanças pelas quais os mamíferos têm passado desde o seu surgimento, há 200 milhões de anos, na era Mesozoica. Vveja mais sobre o assunto em 

A lacuna deixada pelos dinossauros não-avianos há 66 milhões de anos foi a oportunidade perfeita  para que esses animais ocupassem esse nicho, expandindo seus recursos adaptativos.

O QUE FAZ DOS MAMÍFEROS, MAMÍFEROS?: 

LEITE MATERNO E PROCESSOS DE REPRODUÇÃO

Que o leite materno é fonte de nutrientes você provavelmente já sabe. Mas além dos nutrientes, o leite materno pode ser também fonte de anticorpos para algumas doenças. Um estudo publicado em abril de 2021, na revista científica JAMA, empreendido pelos pesquisadores israelenses Sivan Haia Perl, Atara Uzan-Yulzari e Hodaya Kleiner, apontou  que mulheres lactantes que receberam as doses da vacina para o Novo Coronavírus apresentaram uma considerável quantidade de anticorpos provenientes dos imunizantes capaz de ser passado para bebês e recém-nascidos em estágio de amamentação.

O leite materno é fonte de nutrientes e também de anticorpos, como apontam pesquisas recentes. Fonte da imagem: Helena Lopes/Unsplash 

Em um dado momento da diversificação dos animais, somadas a uma série de mudanças anatômicas e fisiológicas, surgiram em algumas espécies uma estrutura anatômica responsável pela produção de leite. A partir desses novos recursos adaptativos denominados de glândulas mamárias, foi possível reunir alguns animais no grupo que hoje chamamos de Mammalia ou mamíferos. 

A amamentação dos filhotes é uma grande vantagem evolutiva aos mamíferos, mesmo diante de condições adversas como a escassez de alimentos. Esses são os únicos animais dentre vertebrados e invertebrados em que as mães conseguem transformar reservas de gordura em alimento para os filhotes, garantindo sua sobrevivência. Uma curiosidade: os mamíferos também são animais endotérmicos, que possuem a habilidade de manter a temperatura corporal estável sem depender de condições externas! É por meio disso que eles conseguem correr para longe de predadores como os répteis que, como pode ser observado em 

, precisam se aquecer ao sol para obter a energia necessária para atividades físicas como a caça.

Filhotes de gatos se alimentando. Fonte da imagem: Kym Ellis/Unsplash 

Mas dizer que “todo mamífero possui mamas” é um parâmetro de classificação que excluiria mamíferos como os ornitorrincos e cangurus, por exemplo. Divergentes da maioria, esses animais possuem algumas particularidades em relação à reprodução e às glândulas mamárias, presentes não na forma de mamas (mamilos). Por esse motivo, são considerados mamíferos monotremados e metatérios.

MONOTREMADOS E METATÉRIOS: 

OS MAMÍFEROS QUE PÕEM OVOS E OS MAMÍFEROS DE “BOLSA”

Como observado, é comum pensar em animais que possuem mamas, que produzem leite ou que se reproduzem dentro de um útero quando se fala em mamíferos, certo? Contudo, vale salientar que, dentre os animais que compõem esse grupo, existem aqueles que não são gerados em úteros, mas que produzem leite, ainda que não o acesse por meio de mamilos. Aqui estamos falando dos monotremados e metatérios.

O ornitorrinco é um mamífero semiaquático que está distribuído no território da Austrália e da Tasmânia e é lembrado por ter um corpo curioso, composto por nadadeiras e uma marcante estrutura na face semelhante ao bico de pato. Junto com a equidna, esses animais formam o grupo dos Monotremata por serem mamíferos ovíparos, ou seja, que põem ovos. Outra característica dessas espécies é que, ao invés de possuírem um aglomerado de glândulas mamárias em uma região do corpo (formando um mamilo), elas apresentam tais glândulas dispersas pelo corpo. Por esse motivo, durante a amamentação, os filhotes lambem o “suor” da mãe, já que as glândulas mamárias liberam o leite diretamente pela pele.

O ornitorrinco é um mamífero aquático ovíparo (que põe ovos). Fonte da imagem: Wikipedia 

Já o grupo dos mamíferos metatérios é composto por animais que apresentam uma estrutura anatômica externa com glândulas mamárias semelhante a uma bolsa, denominada marsúpio. Muito útil durante a reprodução e gestação de espécies como os gambás, coalas e cangurus, essa “bolsa abdominal” é formada por uma dobra de pele que recobre as glândulas mamárias das fêmeas. Mas como se daria a reprodução nesse caso? Bem, a gestação dos filhotes de tais espécies é mista, com o feto sendo desenvolvido inicialmente dentro do corpo da fêmea e, posteriormente, fora do corpo, nessa espécie de “bolsa externa”. Até o fim da gestação os filhotes ficam ali para completarem seu desenvolvimento, agarrados a um mamilo que provê o leite materno. 

Atualmente os mamíferos ocupam quase todos os continentes do planeta Terra: desde os ursos polares que vivem nas regiões extremamente geladas do Polo Norte até os leões presentes nas quentes savanas africanas. Mas veremos que não foi só em terra firme que se deram as várias adaptações desses animais, como é o caso dos mamíferos voadores e aquáticos.

MORCEGOS: EXEMPLOS DE MAMÍFEROS VOADORES

Geralmente associamos a habilidade de voo às aves e aos insetos, mas existe um grupo de mamíferos que também consegue voar: conhecidos como quirópteros, essa ordem abrange animais como os morcegos. Esses animais são lembrados por seus hábitos noturnos, já que seu pico de atividade (de caça e busca de alimentos) se dá após o pôr-do-sol.

O morcego é um exemplo de mamífero voador. Fonte da imagem: Johannes Giez/Unsplash 

Com a ausência de luz e a pouca visibilidade à noite, os morcegos desenvolveram uma habilidade para encontrar comida e se comunicar com seus companheiros de espécie: a ecolocalização. Esta característica consiste na capacidade desses animais de emitir e interpretar sons por meio de suas estruturas anatômicas. Porém, esse recurso não é exclusivo desses mamíferos; como podemos ver em 

, já que os golfinhos também apresentam essa característica. Você já parou para pensar em como surgiu essa similaridade entre espécies tão distintas?

Apesar de serem mamíferos e de possuírem essa habilidade em comum, morcegos e golfinhos não são parentes próximos. Os golfinhos pertencem à ordem Cetartiodactyla e os morcegos pertencem à Chiroptera, dois grupos completamente distintos tanto anatomicamente quanto com relação aos ambientes em que vivem. Mas como ambos apresentam uma mesma característica se não são parentes? Significa então que cada um desenvolveu a mesma característica independentemente do outro? Sim! Esse fenômeno é conhecido como Convergência Evolutiva e um dos primeiros estudiosos a identificá-lo foi o biólogo e paleontólogo britânico Richard Owen (1804-1892), o mesmo estudioso que sugeriu o uso do termo “dinossauro” para se referir aos gigantes répteis pré-históricos e que você pode conferir em

 

Richard Owen, cientista responsável pela proposição da Convergência Evolutiva. Fonte da imagem: Wikipedia 

Na Convergência Evolutiva (ou evolução convergente), duas espécies de origens distintas acabam tendo a mesma característica, que por sua vez não estava presente no ancestral comum mais recente delas. No caso dos morcegos e dos golfinhos, tais espécies desenvolveram sua própria forma de realizar a ecolocalização a partir das pressões evolutivas que sofreram no decorrer de seus respectivos percursos adaptativos.

OS MAMÍFEROS AQUÁTICOS E O RISCO DE EXTINÇÃO

Como pode ser percebido no evento 

, a ocupação dos ambientes terrestres por plantas e animais representou um grande passo para a diversidade dos vertebrados. Isso se deu há milhões de anos, no momento em que os primeiros tetrápodes começaram a migrar das águas para a terra. Essa mudança resultou na perda de algumas estruturas especializadas para a vida marinha, tais como a bexiga natatória, as brânquias e a modificação do sistema de respiração para um sistema aéreo, por exemplo. 

Essas novas adaptações foram necessárias já que a água não seria mais um meio de realizar trocas gasosas. Contudo, como também pode ser notado no evento 

, houveram alguns mamíferos que retornaram ou se mantiveram nos ambientes aquáticos. Deles, temos os cetáceos, dentre os quais estão os golfinhos e as baleias. Esses animais apresentam elementos na estrutura anatômica diferente dos peixes (inteiramente adaptados à vida subaquática), como a presença de pulmões e a separação entre sistemas respiratório e digestório. 

Os golfinhos são exemplos de mamíferos aquáticos. Fonte da imagem: Pixabay 

Como também pode ser notado em 

, outro ponto acerca desses animais é a luta pela sobrevivência na contemporaneidade, já que alguns cetáceos ocupam as listas das espécies mais ameaçadas pela ação humana.

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Published in 16/06/2021

Updated in 27/09/2021

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