ABERTURA DA PASSAGEM DE DRAKE

23000001 BCE (Circa)View on timeline

PASSAGEM DE DRAKE: O MAR MAIS PERIGOSO DO MUNDO

Como pode ser notado em 

, a lacuna deixada pelo desaparecimento dos dinossauros não-avianos ao final do Cretáceo viabilizou a ascensão e diversificação dos mamíferos em escala planetária. Além deles, as aves também se sobressaíram nesse período, modificando-se para ocupar ambientes variados, como as aves-do-terror na América do Sul, conforme destaca o evento

, e os pinguins na Antártida, brevemente apresentados no evento 

Pinguins da Antártida. Fonte da imagem: Unsplash/Tam Warner Minton 

Cerca de 140 milhões de anos antes do surgimento dos primeiros pinguins, o continente americano se separou da Antártida. Há aproximadamente 65 milhões de anos, no período Cretáceo, os dois continentes estiveram unidos novamente pelo sul, dando origem à região hoje conhecida como Patagônia. Em 

 

, você pode observar que entre 56 e 34 milhões de anos atrás surgiram as principais cordilheiras e cadeias montanhosas do planeta, que já apresentava uma configuração geográfica dos continentes muito semelhantes à atual. Mas, foi somente há 23 milhões de anos que se formou a região que separa a América e o continente antártico, local onde hoje se entrelaçam os oceanos Atlântico e Pacífico: a Passagem de Drake. 

Esse mar extremamente perigoso carrega o nome de um explorador britânico que não chegou a atravessá-lo: Francis Drake (1540-1596), conhecido por ser o primeiro inglês a realizar uma volta ao mundo em pleno século XVI.

A PASSAGEM DE DRAKE E SUAS PARTICULARIDADES

Em dezembro de 2019, o avião C-130 Hércules partiu da cidade de Magallanes, Sul do Chile, e atravessaria a famosa Passagem de Drake até chegar à Antártida. Pertencente à Força Aérea chilena, levava a bordo 38 pessoas, dentre estudantes e soldados. Faltando cerca de uma hora para o pouso no continente antártico, os radares perderam o contato com a aeronave, dando início a um trabalho de buscas que mobilizou diversos navios e aviões. Após dias, os destroços do avião foram achados na região marítima entre o continente sul-americano e a Antártida. Nenhum dos passageiros foi encontrado vivo.

Esse fato recente mostra o porquê da Passagem de Drake ser tão temida pelos pilotos de aeronaves e navegadores. Só para que você tenha uma ideia, alguns registros indicam que, na região, já naufragaram cerca de 800 embarcações! O local é uma área de baixa visibilidade, com ventos e correntes que podem provocar ondas de 6 a 10m de altura. Além disso, a travessia é caracterizada pelas mudanças de tempo repentinas, já que a passagem possui uma grande profundidade e um sistema de circulação atmosférica bastante peculiar.

A Passagem de Drake possui cerca de 650km de largura e compõe o oceano Antártico, apresentando temperaturas baixíssimas que variam entre -25ºC a 0ºC durante o ano inteiro. A estimativa é que o tempo necessário para atravessá-la de uma costa à outra seja de aproximadamente 40 horas. Essas condições extremas contrastam com os desajeitados, porém exímios nadadores, os pinguins. Este símbolo da Antártida, além de ser um dos poucos animais que conseguem atravessar a Região do Drake com facilidade, também é evidência biológica de que, há milhões de anos, América e Antártida já foram uma só porção de terra. Mesmo diante da região marítima com as piores condições meteorológicas do mundo, todos os anos, os pinguins-de-magalhães fazem sua travessia rumo aos litorais sul-americanos em busca de alimento.

Como esses animais sobrevivem às águas revoltas e extremamente geladas da Passagem de Drake? Quais são as adaptações corporais que revelam a alta capacidade dos pinguins para o nado em longas distâncias e ambientes extremos? E por que essas aves, eventualmente, chegam às praias capixabas? A peça taxidermizada do pinguim-de-magalhães, presente no acervo do Museu de História Natural do Sul do Estado do Espírito Santo (Muses), pode responder algumas dessas questões, revelando que os hábitos dessas aves podem estar mais ligados aos desequilíbrios ambientais provocados pela humanidade do que imaginamos. 

PASSAGEM DE DRAKE X PINGUINS ANTÁRTICOS

Para os pinguins, atravessar a Passagem de Drake é algo muito comum, prática que muitos navegadores (até os mais experientes) fazem com certa dificuldade, mesmo com navios que pesam toneladas e apresentam tecnologia de ponta. Isso acontece porque essas aves possuem o corpo afilado na cabeça e nadadeiras que cortam a resistência da água, permitindo que esses animais cheguem a até 40km/h em ambiente aquático. 

Com essas adaptações hidrodinâmicas, eles são capazes de atravessar diariamente uma distância de 173km, em profundidades de até 90m, segurando o fôlego por quase 5 minutos! Inclusive, essa habilidade auxilia na captura de peixes, lulas e crustáceos, que compõem toda a sua alimentação e demandam dessas aves uma grande quantidade de energia durante a caça.

Com as adaptações hidrodinâmicas, os pinguins são capazes de atravessar longas distâncias e nadar em águas profundas. Fonte da imagem: Unsplash/Joshua Ryder 

Os primeiros pinguins do planeta surgiram no período Cretáceo, há cerca de 66 milhões de anos, período em que os dinossauros não-avianos foram extintos da Terra. Com a posterior reconfiguração dos continentes, as linhagens adaptativas dos pinguins sofreram com a dispersão e o isolamento de algumas espécies em determinadas regiões do planeta. Alguns registros fósseis dessas aves demonstram isso, pois já foram encontrados na América do Sul, na Antártida e na Nova Zelândia. Esses achados paleontológicos demonstram que os pinguins viventes na atualidade são frutos de diversos cruzamentos e sobreposições de linhagens diferentes, gerando variações genéticas e características específicas entre as diferentes espécies.

No geral, esses animais são constantemente confundidos com mamíferos, por não possuírem penas como as demais aves. No entanto, os pinguins são seres ovíparos (que possuem uma capacidade de colocar entre 1 a 2 ovos por temporada reprodutiva) e que costumam formar casais monogâmicos (o mesmo parceiro para a vida toda). Tanto o macho quanto a fêmea compartilham a incubação (que dura cerca de 39 a 42 dias), mantendo o cuidado parental mesmo após o nascimento do filhote. Os ninhos de pinguins são pequenos buracos no chão ou em tocas distribuídas em locais como Argentina, Ilhas Malvinas e Chile.

Os pés dos pinguins contêm quatro dedos unidos por uma membrana que auxilia o nado. Essas aves geralmente vivem em média de 15 a 20 anos e possuem o hábito de se agruparem em comunidades numerosas marcadas como pinguineiras, que podem chegar a milhões de indivíduos. Todas as espécies de pinguins possuem o peito branco (às vezes levemente alaranjado, como nos pinguins-imperadores) e as costas pretas. 

Além disso, o corpo desses animais é coberto por uma plumagem que forma uma espessa camada de ar entre as penas, servindo de isolante térmico. Outra adaptação que contribui para que não se molhem facilmente é a presença de uma rica camada de gordura embaixo da pele, que também funciona como uma reserva de energia em períodos de escassez de alimentos. Em alguns casos, a perda de penas em alguns fragmentos da plumagem pode minimizar a interrupção da camada de ar. Nessas situações, os pinguins passam a utilizar essa reserva de gordura, produzindo uma fina camada de óleo que diminui a quantidade da reserva energética e isolamento térmico, mas mantém a impermeabilidade. É por essa razão que tais aves adotam uma alimentação rica em peixes gordurosos. 

OS PINGUINS-DE-MAGALHÃES NO ESPÍRITO SANTO

É bem comum o encalhamento de espécies marinhas no litoral do Espírito Santo, como os pinguins-de-magalhães (Spheniscus magellaniscus). A escassez de alimento é um dos fatores que contribuem para o aumento dos encalhamentos nas praias, uma vez que tais animais chegam desnutridos e hipotérmicos. Atualmente, o Muses possui um exemplar taxidermizado do pinguim-de-magalhães, que chegou à instituição por meio de [INSERIR INFORMAÇÕES ADICIONAIS] . A peça possui [INSERIR INFORMAÇÕES ADICIONAIS] de altura e pesa cerca de [INSERIR INFORMAÇÕES ADICIONAIS].

Pinguim-de-magalhães adulto e seus filhotes. Fonte da imagem: Wikipedia/Guglielmo Celata 

O pinguim-de-magalhães é uma ave marinha originária da Patagônia, região do extremo Sul do continente americano, e que realiza movimentos migratórios sazonais em busca de alimento. Por meio da corrente marítima das Malvinas, os pinguins-de-magalhães percorrem o oceano Atlântico (entre a Argentina, Chile, Uruguai, Malvinas e o Sul do Brasil) em grupos para se alimentarem de peixes, lulas e crustáceos. Mas, ocasionalmente, alguns visitantes se perdem do grupo principal e acabam parando no litoral capixaba por vezes desnutridos, impossibilitando que retornem ao seu lugar de origem.

Em determinadas épocas do ano é comum a mídia publicar algumas reportagens sobre a chegada de pinguins-de-magalhães na costa capixaba. A recorrência desses casos fez com que alguns biólogos e médicos veterinários fundassem, em 2010, o Instituto de Pesquisa e Reabilitação de Animais Marinhos (Ipram), um órgão de conservação que visa promover a reabilitação de pinguins-de-magalhães que encalham nos litorais do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia e Alagoas.

Além de desenvolver estratégias de conservação a partir de pesquisas realizadas sobre a espécie, o Ipram também abriga ações de educação ambiental. Uma delas é o Projeto NovosMarES, iniciativa da bióloga marinha, oceanógrafa e colaboradora do Ipram, Jeane Santos de Jesus. Por meio do projeto, atividades são desenvolvidas voltadas para escolas e eventos com o objetivo de conscientizar e sensibilizar os públicos a respeito da preservação da vida marinha. 

Um outro ponto reforçado pelos especialistas do Instituto são os cuidados médicos com esses animais em situações de encalhamento nas praias. A falta de informação da população sobre uma conduta correta no resgate de pinguins geralmente agrava o estado de saúde deles, já debilitados pela desnutrição, hipotermia e pela longa viagem. É muito comum, por exemplo, que as pessoas ao encontrarem os pinguins - e por os associarem a ambientes frios -, colocarem-nos em caixas de isopor com gelo, o que pode levar o animal (já em estado hipotérmico) à morte mais rapidamente. O Ipram orienta que, caso sejam encontrados, o primeiro passo é colocar o animal em uma caixa de papelão coberta com jornal para que ele possa se aquecer. Em seguida, acionar as autoridades responsáveis ​​e qualificadas para fazer o resgate.

Pinguim-de-magalhães pertencente ao acervo do Muses.  

BRASIL X ANTÁRTIDA: A CONEXÃO COM OCONTINENTE GELADO

Você sabia que o Brasil possui uma base de pesquisas no continente mais gelado da Terra? A Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF) é um dos desdobramentos do Programa Antártico Brasileiro (Proantar) e foi inaugurada em 1984. Instalada para fins geopolíticos, ambientais e científicos, a base tem abrigado diversos pesquisadores que realizam estudos sobre o continente antártico e os impactos de suas condições climáticas no território brasileiro. Contudo, a EACF não é o único centro de pesquisa da região. Desde que o Tratado da Antártida foi assinado em 1959 pelas nações que reivindicavam seu território (algo que já estava acontecendo desde a primeira metade do século XX), todo o continente tem sido ocupado por bases científicas de diversos países do mundo, voltadas para a exploração científica, em regime de cooperação internacional.

Além do objetivo de estudar as mudanças climáticas, algumas expedições têm o propósito de lutar contra o preconceito, a desigualdade e a misoginia. Foi o caso, por exemplo, da excursão promovida pelo Programa Homeward Bound (HB) em 2016, a maior expedição à Antártida formada apenas por mulheres. A ativista ambiental Natalie Unterstell foi a única brasileira a compor a equipe de 76 cientistas de vários lugares do mundo que passaram 20 dias no continente gelado. A ação visava reafirmar a presença e a solidariedade entre as mulheres na ciência, um campo de atuação ainda majoritariamente masculino.

Natalie Unterstell: a única brasileira a compor a equipe de 76 cientistas da excursão promovida pelo Programa Homeward Bound (HB). Fonte da imagem: DRCLAS/Havard University 

Porém esse interesse dos países no território antártico revela sua importância como campo de estudos para descobertas históricas, tais como os achados fósseis de pterossauros, encontrados pela primeira vez no local por equipes brasileiras de pesquisa. A paleontóloga brasileira Juliana Sayão, que já esteve em quatro expedições pelo continente e que hoje atua no Museu Nacional (RJ), afirma que “os pterossauros são encontrados em praticamente todos os continentes, mas até [os dias de] hoje não haviam sido registrados na Antártica. Então, com essa descoberta, conseguimos traçar como era a rota desses animais na época em que eles viviam, como se deslocavam de uma massa continental para outra. É muito importante nosso trabalho porque toda a diversidade atual do nosso planeta tem uma origem no passado”. Outros registros fósseis encontrados no continente antártico são ancestrais de aves que hoje são capazes de atravessar o mar mais perigoso do mundo, mas que surgiram no final do período Cretáceo, há 65 milhões de anos, popularmente conhecidos como pinguins. 

OS IMPACTOS AMBIENTAIS QUE AMEAÇAM OS PINGUINS

O crescente número de pinguins-de-magalhães encalhados no litoral capixaba desde 2006 tem alertado os pesquisadores e biólogos marinhos para alguns fatores ambientais relacionados à escassez de alimentos em alto mar. Estudos recentes revelam que fenômenos de aquecimento das águas oceânicas - como os famosos El Niño e La Niña - têm provocado a escassez de peixes em determinadas regiões, principalmente as que estão próximas à linha do Equador. A pouca incidência desses animais tem feito com que pinguins percorram distâncias ainda maiores para a busca de alimento, que também servirá de refeição para seus parceiros e filhotes, que acabam esperando por mais tempo. Isso demonstra a importância dos pinguins como indicadores da qualidade ambiental e das mudanças causadas pela atividade humana.

Morre pinguim resgatado em praia no Sul do ES 

Dentre os fatores que não só interferem na escassez de alimento aos pinguins-de-magalhães, mas também colocam em risco a vida desses animais, temos a crescente quantidade de óleo derramado nos oceanos por navios e embarcações, como pode ser visto em 

Alguns eventos como a poluição crônica por hidrocarbonetos na costa da Argentina (que causa a morte de 42 mil pinguins todo ano) e as mudanças climáticas que causam o derretimento do gelo e destroem seu habitat natural também podem alterar o regime de chuvas em colônias de postura de ovos. Com o alagamento de ninhos, filhotes da espécie podem morrer afogados. 

Pinguim afetado por petróleo. Fonte da imagem: ciclovivo.com.br 

Além disso, eventualmente os pinguins podem ser atropelados por embarcações e/ou capturados por redes de pesca. Enfraquecidos pelas tentativas de se desvencilhar dessas redes, esses animais podem morrer afogados ou encalhar nas praias após serem levados pelas correntes marítimas. Como é observado em 

, no Espírito Santo também é comum o encalhamento de algumas espécies de cetáceos (baleias e golfinhos), como o boto-cinza, que você pode conhecer mais em 

Em ambos os casos, o Instituto de Pesquisa e Reabilitação de Animais Marinhos (Ipram) realiza trabalhos de resgate, reabilitação e soltura desses animais, contando também com atividades educativas que simulam atendimentos a encalhes e contribuem para a preservação da espécie.

Pinguins resgatados pelo Ipram-ES. Fonte da imagem: Ipram-ES 

Antes de 2010, a presença de pinguins-de-magalhães era classificada como “Pouco preocupante”, de acordo com dados da IUCN Red List. Contudo, a partir daquele ano a espécie foi categorizada como “Quase ameaçada”, dando início a elaboração conjunta de um Projeto Nacional de Monitoramento, com o propósito de evitar o agravamento de sua situação de ameaça. Tal iniciativa, realizada entre o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres (Cemave), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e Ministério do Meio Ambiente (MMA), consistia em um compilado entre estudos e conhecimento sobre a espécie, identificando os principais fatores de ameaça e propondo uma série de medidas para preservação dos pinguins-de-magalhães.

0 comments

Comment
No comments avaliable.

Author

Info

Published in 20/07/2021

Updated in 25/09/2021

All events in the topic Fauna bichos do mar:


541000001 BCE (Circa)PALEOZOICOPALEOZOICO
16/06/1981 • 14:28:12 BCEPETRÓLEOPETRÓLEO
75000001 BCE (Circa)GONDWANA - VIDA MARINHA - CONEXÃO BRASIL-ANTÁRTIDA GONDWANA - VIDA MARINHA - CONEXÃO BRASIL-ANTÁRTIDA
56000001 BCE (Circa)EOCENOEOCENO
1986PROIBIÇÃO À CAÇA DAS BALEIASPROIBIÇÃO À CAÇA DAS BALEIAS
23000001 BCE (Circa)ABERTURA DA PASSAGEM DE DRAKE
1815RIO ITAPEMIRIM