Educação Bilingue
Para Lane (1992), após 15 anos de Comunicação Total nos Estados Unidos, não houve alterações significativas no perfil acadêmico dos alunos surdos. O sucesso prometido não foi alcançado, já que a língua de sinais, utilizada nessa abordagem educacional como mero suporte para a aquisição das línguas orais, não serviu para renovar as concepções hegemônicas de surdos e surdez, centradas na representação de deficiência, e, portanto, não promoveu mudanças relevantes na Educação de Surdos.
No final da década de noventa, constatadas as limitações da Comunicação Total nos resultados educacionais dos alunos, os profissionais da escola, insatisfeitos com os resultados obtidos nas suas práticas, buscaram novamente outros caminhos teóricos que os levaram a valorizar a língua de sinais como um sistema linguístico legítimo e a repensar o seu papel no processo de ensino-aprendizagem. Essas reflexões fizeram com que uma nova perspectiva educacional começasse a ser construída, pois à medida que a língua de sinais passa a ser entendida como um sistema pleno, os sujeitos surdos deixam de ser vistos como casos patológicos ou deficientes da comunicação e passam a ser olhados como uma minoria linguística. Em decorrência disso, e com base na crescente produção acadêmica de pesquisadores brasileiros e de estudiosos de várias partes do mundo acerca da educação bilíngue para surdos (Ferreira Brito,1993; Fernandes,1990; Felipe,1988; Quadros, 1997, Behares,1993, dentre outros), a Educação de Surdos em São Bernardo do Campo, a partir de 1997, optou por um projeto educativo que se pauta por:
a) uma visão socioantropológica da surdez definida como diferença histórica e socialmente construída em práticas de significação e representações compartilhadas entre os surdos e como uma experiência visual e heterogênea (Skliar, 1998);
b) uma educação bilíngue que priorize a língua de sinais como língua natural e língua de instrução, e a aprendizagem da Língua Portuguesa como segunda língua;
c) um currículo pensado para e com os surdos que não se limita a simples circulação da língua de sinais no espaço escolar, mas que se propõe a dialogar com discursos, identidades e produções culturais dos surdos,
isto é, com seus modos de significar o mundo como sujeitos discursivos.
Basicamente, os defensores da educação bilíngue advogam (e ainda lutam por isso) um projeto educativo que incorpore como princípios norteadores a utilização da língua de sinais como primeira língua e língua de instrução na escola (acesso à informação e construção de conhecimento) seguida da aprendizagem da Língua Portuguesa como segunda língua. Essa nova proposição levou à revisão de concepções e práticas pedagógicas baseadas na tradição da Educação Especial, na medida que, ao considerar os surdos como uma minoria linguística, levava a um deslocamento das questões educacionais dos surdos: da medicalização da surdez, da visão colonialista em relação à comunidade surda e sua língua, para uma concepção sociocultural, que concebe os surdos em sua diferença, acentuando aspectos positivos como língua, cultura, a história das comunidades surdas, suas lutas por direitos linguísticos e civis conduzidas por suas entidades organizadas em muitos países do mundo. (Favorito, 2006)
A Proposta Curricular da Educação de Surdos em São Bernardo do Campo, que oferece atendimento educacional às crianças, jovens e adultos surdos na Estimulação Essencial, Educação Infantil e Ensino Fundamental, vem sendo construída, desde finais da década de noventa, a partir dessa perspectiva, que reconhece e trabalha como potencialidades educacionais dos surdos no sentido apontado por Skliar (1998), isto é, “visando à organização de uma política educacional que reconheça a diferença” (p. 25). Reconhecer a diferença no campo da educação de primeiro lugar, reconhecer os direitos significativos, que os surdos têm de desenvolver suas potencialidades linguísticas, culturais, comunitárias, identitárias. Incorporando essa reflexão, o projeto político e educacional da escola se move a partir da crença nas potencialidades dos surdos, que podem ser definidas assim segundo Skliar (1998) (SÃO BERNARDO DOO CAMPO, 2007, p. 24-25).
São Bernardo do Campo. Secretaria de Educação e Cultura. Departamento de Ações Educacionais. Proposta Curricular. v. II, caderno 5. São Bernardo do Campo, SP, 2007.
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