Dirce Galvão

Dirce Galvão

Texto por Victor Marques

O conjunto habitacional de Vila Paciência, referenciado popularmente como Favela do Aço, construído no ano de 1967 no bairro de Santa Cruz, na Zona Oeste carioca, mostra-se constituído por diversas memórias de personalidades que marcaram os espaços vividos dos âmbitos sociais e culturais das mais de cinco décadas do local, dentre elas, a docente e ativista comunitária Dirce Galvão. 

Nascida no ano de 1959, Dirce passou décadas de sua vida no Morro dos Macacos, em Vila Isabel, no recorte Zona Norte do município do Rio de Janeiro, onde atuou durante mais de vinte anos em projetos locais trazendo sua docência como professora na região.  

Formada pelo Centro de Ciências Humanas e Sociais - Instituto Isabel, a educadora atravessou sua atuação pelos anos da segunda parte do século XX, passando pelas diversas transformações político-partidárias, sociais e culturais no país, perpassando as quase duas décadas da ditadura empresarial-militar brasileira e o retorno da redemocratização no país, junto às eleições que seguiram no final dos anos 90.

No início da década de 2000, Rosemary Fonseca, ativista comunitária, convidou a professora para atuar em uma nova iniciativa, então no bairro de Santa Cruz: Ação Comunitária de Apoio Psicossocial (ACAPS), na qual, após anos, veio a adicionar a nomenclatura de Dirce Galvão. A ativista iniciou atuando como coordenadora pedagógica do projeto, estando localizado originalmente em uma lona no sub-bairro do Veridianas. 

O projeto possui, dentre seus objetivos, a maior democratização e expansão das artes para os jovens periféricos de Santa Cruz, instrumentalizando as práticas circenses para a formação pessoal e profissional das crianças e adolescentes da região. Após o processos das anuais enchentes na cidade do Rio de Janeiro, causando amplas destruições nas comunidades cariocas, com diversas residências e instituições comunitárias destruídas, incluindo a sede física da ACAPS, os mesmos mudaram-se para a comunidade de Vila Paciência, fixando ali suas atuações. 

Dirce tornou-se então diretora da instituição, com a ação voluntária sendo integrada ao projeto "Unicirco", iniciativa circense realizada nas comunidades fluminenses, idealizada e organizada pelo ator, trapezista e empresário Marcos Frota. 

Em conjunto com as aulas de formação nos diversos âmbitos do circo, em que as crianças e adolescentes passavam com seus professores nas experimentações dos saberes artísticos, Dirce atuava como uma figura familiar dos jovens do projeto, exigindo a regularidade escolar dos discentes de sua ONG, trabalhando os problemas pessoais deles, utilizando rotineiramente a formação de círculos para a troca de saberes junto aos alunos, atuando na construção como indivíduos e principalmente cidadãos, com suas habilidades potencializadas através da educação popular e dos fazeres da arte. A educadora por muitas vezes mostra-se referenciada por muitos do local como uma representação materna, tal como relatou o artista Jhonatan Rodrigues, membro da então ACAPS - Dirce Galvão, em entrevista concedida no dia 30 de agosto de 2023.

A docente faleceu em 2015, aos 56 anos, deixando um amplo legado vivo e pulsante até os dias atuais: a instituição que traz a resistência de sua história atua até os dias de hoje com mais de 200 alunos, com grupos que atuam em outros continentes, renovando anualmente o ciclo de jovens da comunidade do Aço que formam as escrevivências do instituto. No ano de 2022, a educadora foi referenciada na poesia "Carta para Dirce Galvão", da escritora e artista teatral Virgínia Moraes, na coletânea "Cartas para Esperança", da Malê Editora, lançada na FLUP 2022 - Festa Literária das Periferias. Dirce, para sempre, presente!!

Conheça mais:

Coronavírus no Dia a Dia das Favelas, Parte 3: A Resistência da Favela do Aço, em Santa Cruz, Frente ao Desafio

Projeto Levante o Aço - Facebook

Escritoras negras lançam "Cartas para Esperança" no Salão Carioca do Livro

Teaser "Cartas para Esperança" - Santa Cruz 

REFERÊNCIAS

LUDEMIR, Julio (org.). Cartas para Esperança. Rio de Janeiro: Malê, 2022.

MARCOS Frota apresenta o trabalho de inclusão da Unicirco. TV Brasil [On-line], 10 jun. 2011.  Disponível em: https://tvbrasil.ebc.com.br/programaespecial/episodio/marcos-frota-apresenta-o-trabalho-de-inclusao-da-unicirco. Acesso em: 20 ago. 2023.

PRIOSTI, Walter; PRIOSTI, Odalice. Ecomuseu, Memória e Comunidade: Museologia da Libertação e piracema cultural no Ecomuseu de Santa Cruz. Rio de Janeiro: Camelo Comunicação, 2013.

RODRIGUES, Jhonatan. Entrevista com Jonathan Rodrigues [Entrevista concedida a Victor Marques]. Victor Marques,  [s.n],  Rio de Janeiro, 30 de Agosto de 2023.

UNICIRCO. Programa Ação (TV Globo). Unicirco. YouTube, 3 out. 2011.  Disponível em: https://youtu.be/XIcOlTa3LuM?feature=shared. Acesso em: 20 ago. 2023.